Uma Constituição é um meio e não um fim em si mesma.
Esta constituição de 1988 veio com lautas celebrações e muita fanfarra. Mas é um fiasco. E é preciso que alguém diga que o “Rei está nu”.
Simplesmente remendar esta constituição, ou até modificá-la, mas mantendo o clima de escaramuças que mantém com a lógica, sob a batuta interesseira dos políticos de plantão, só nos remeterá de volta ao ponto de partida.
O que precisamos, antes de mais nada, é uma nova visão do país que desejamos ser no novo milênio. Um futuro que mobilize os corações e mentes da sociedade brasileira, particularmente das novas gerações, e traga todos para um mutirão de reorganização do Brasil.
Com este objetivo em mente, a sociedade tem ao seu alcance os meios oferecidos pela internet e pelas mídias sociais. Agora é unirmos esforços e iniciarmos a luta.
De uma coisa, porém, podemos ter certeza: o Brasil não terá conserto repetindo o que tem sido feito até agora.
Parafrasendo o estadista Francês Georges Clemenceau, para quem “A guerra é um negócio muito importante para ser deixada para os soldados”, podemos dizer que a “Constituição é um negócio muito importante para ser deixada para os políticos”.
De fato, uma Constituição pode até se pretender alinhada com as melhores práticas sociais, políticas e econômicas, mas não haverá sinceridade neste propósito enquanto ela for mais uma trincheira para proteger poderes, privilégios e benefícios dos poderosos do que uma carta para a nação ter garantida a prosperidade sustentada.
Uma constituição feita sob encomenda dos pregoeiros políticos, que não tem apego à realidade do país, tende a promover a fadiga das expectativas. Simplesmente não dá para implantar no país o Estado de bem estar social como está proposto na atual carta, que é incompatível com o estágio de desenvolvimento do país. Mais ainda que tivéssemos uma constituição realista, esta é condição necessária, mas não suficiente.
A saída que o país precisa é de natureza diferente. E não reside em mais papelório, mais blá-blá-blá legal e burocrático ou em mais gastos obrigatórios ou, ainda, em mais privilégios, mais espertezas, mais mandraqueadas.
A constituição de 1988 foi uma esperança frustrada. Veio em um momento politicamente turbulento e foi redigida sob o impulso voluntarioso da esquerda ignara. Estufada de arrogância e inconsequência, foi um juntado de equívocos de alquimistas da lei que se pensavam magos produzindo a “pedra filosofal”. Infelizmente, a Constituição de 1988 foi incapaz de transformar qualquer coisa em ouro, ainda que transformasse tudo em crise.
Esta carta em vigor é a oitava em pouco mais de um século de república. E já recebeu 93 emendas, sendo 87 emendas constitucionais e seis emendas de revisão. E o país continua preso em uma camisa de força de viés ideológico e de lógica enviesada.
O que conseguiram os constituintes, na verdade, foi fazer uma mágica besta que amarra o país numa camisa de força de vínculos orçamentários, fatias carimbadas do orçamento que impedem a flexibilidade na gestão e medidas várias que tornam o país ingovernável.
Cantada e louvada como um avanço, não cumpriu as promessas que fez, nem atendeu as expectativas que provocou.
A Constituição de 1988 poderia ter sido uma plataforma de progresso, prosperidade e avanço social, mas se tornou um obstáculo por ter falhado em estabelecer um equilíbrio entre os desejos e aspirações com as possiblidades reais da nação.
Falhou por priorizar as minúcias e esquecer o contexto, por ser “regulamentadora” e por ser “uma tartaruga casca grossa”, inflexível e dogmática.
Uma carta magna incapaz de acolher as limitações do mundo real, prometendo uma vasta coleção de direitos e benesses sem pensar em quem vai pagar a conta. Obra típica de bacharéis em dia do “pendura”. Como uma alegoria de escola de samba, desfila uma fantasia coruscante de Estado onipotente. Um Estado provedor, cornucópia do Olimpo, presumidamente ilimitado em seus recursos.
E, dado que quem briga com a realidade sempre perde, a constituinte terminou por organizar no Brasil um Estado em que as contas não fecham. O Brasil ficou inviável, posto que perdulário, disforme, amorfo e irresponsável. Um Estado condenado a inchar por desarranjo genético, condenado a uma obesidade perpétua.
O Brasil já atingiu o estágio da obesidade morbidade máxima. Deixar que o Estado parasita continue a se agigantar, a sorver a seiva vital da sociedade é suicídio certo. Não é preciso ser economista para ver que não dá mais. Nem é preciso ser engenheiro e fazer cálculos de análise estrutural para saber que o peso do Estado está maior do que aquele que a sociedade pode sustentar. Aliás, cada brasileiro sente o peso no próprio costado.
E se fosse pouco, esta constituição em desequilíbrio, do tipo “regulamentadora”, que promete benefícios que não pode entregar é profundamente nefasta. Ela corrói os próprios fundamentos da ordem social ao por em descrédito as possibilidades uma estrutura solvente do Estado.
O faz de conta legal virou um “me engana que eu gosto”. O governo finge que faz, mas não faz. Finge que atende, mas não atende. Basta ver o que acontece com o SUS: uma ficção de “Sistema Único de Saúde”, tão único como o “Rei Momo”, que promete saúde para todos, mas aplica uma tabela irrealista nos preços que paga. O efeito é debilitar todo o sistema de atenção à saúde do país. E obrigar o cidadão a pagar duas vezes pela atenção à saúde.
A hipertrofia do Estado reduz tudo ao modo precário: enquanto arrecada sofregamente, devolve serviços sofríveis. Para o Estado brasileiro, o cidadão é apenas uma unidade contribuinte. No mais puro padrão tecnocrático latino-americano.
O governador Geraldo Alckmin define a crise fiscal brasileira em poucas palavras: “Nós temos no Brasil governo demais e PIB de menos. Não Cabe.” [1]
De modo que, sob as distorções desta constituição somos um Estado Frankstein.
Passados quarenta anos, continuamos ainda uma “Belíndia”, como definiu em 1974, o economista Edmar Bacha em sua “Fábula para Tecnocratas.” No artigo, chamava a atenção para a desigualdade da distribuição de renda no Brasil.[2]
Explicava que, em nosso país, enquanto uma parte seria comparável a rica Bélgica, a maioria do país seria como uma imensa Índia, pobre e carente. E ao que podemos ver, quarenta anos depois, parece que, se avançamos, foi muito pouco.
E antes que os bacharéis venham para o debate com seu jargão do formalismo do direito e suas reticencias, é bom lembrar que, como consagra o parágrafo único do artigo primeiro da Constituição: “Todo o poder emana do povo”. De modo que, filigranas à parte, um movimento que venha do povo, ou que seja respaldado pelo povo, é legítimo.
O que importa é que um movimento de mobilização de todos os brasileiros, mas especialmente das novas gerações, alimentado pela energia e desprendimento dos jovens, pode e, a julgar pelo que dizem as ruas, vai colocar na pauta do Brasil as mudanças digitais e a renovação paradigmática a que tem direito.
Afinal, o Brasil tem jeito, e o jeito é digital.
Ceska – O digitaleiro.
[1] Alckmin, Geraldo – http://exame.abril.com.br/economia/noticias/agronegocio-cerra-fileiras-contra-volta-da-cpmf – postado 21/09/2015
[2] Bacha, Edmar – http://iepecdg.com.br/Arquivos/ArtigosBacha/Bel%EDndia.pdf – Internet – 15/11/3015