ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR

PARTE 7 – O GLOBE-TROTTER DO PAPA – A SAGA DO PADRE NIVERSINDO CHERUBIN (O CRIADOR DAS FACULDADES DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL) 

­O GLOBE-TROTTER DO PAPA
“Globe-trotter” é uma expressão de origem norte-americana que, segundo o dicionário, significa algo como “viajante do mundo”. A expressão refere-se a uma pessoa cuja atividade e interesses a levam a viagens frequentes para os mais diferentes e distantes recantos do globo. Portanto define com perfeição o Pe. Cherubin e sua vida de viajante à serviço da saúde, de sua ordem religiosa, da Igreja e, por mais de um lustro, à serviço de dois Papas.
– Vocação e reconhecimento
Guiado pela vocação religiosa, o Pe. Cherubin abraçou seu ministério tanto com idealismo e abnegação como com o senso de missão que recebeu das palavras de Tiago, quando dizia, em sua Epístola que a “a fé sem as obras é morta”.
Para o Pe. Cherubin, assim como o era para Tiago, a verdadeira fé não é apenas crer, mas, sobretudo, agir. Todavia, em seu entender, as obras que contam são aquelas que produzem um bem mensurável. Obras sem resultados positivos seriam tão vazias como aquelas boas intenções que o vulgo diz que forram o inferno. Daí que, tomado por essa obsessão por obras proveitosas, acabou por descobrir a obra de seu colega religioso, o padre Luca Pacioli, o frade franciscano, matemático e teólogo italiano conhecido como o pai da contabilidade moderna. O Frei Pacioli, em 1494, publicou a obra “Summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalita”, na qual descreveu a contabilidade das partidas dobradas. Não a inventou, propriamente, mas divulgou o método que já era usado por mercadores venezianos. Seu mérito foi ter sido o primeiro a publicá-lo, tornando-o amplamente conhecido. O fato é que a sua obra é a base da contabilidade moderna. E o Pe. Cherubin, ao se dar conta de que a contabilidade permitia não só avaliar, como dar direção e qualidade para as obras que realizava, se tornou um estudioso da contabilidade. E todas as suas iniciativas passaram a ser meticulosamente planejadas, organizadas, realizadas e avaliadas com as melhores práticas contábeis. E esse era o segredo de seu fulgurante sucesso.
Assim, munido desta disposição de agir para provar sua fé foi que, desde os primeiros dias do seminário, sentiu-se cativado pela exortação de São Camilo de Lellis, o fundador dos camilianos, que recomendava a seus seguidores “ter mais coração nas mãos”. Então passou a pautar sua vida religiosa por esses dois princípios básicos: mostrar sua fé pela ação concreta, de resultados medidos e comprovados, e consagrar-se à causa da saúde e da humanização nelas colocando todo o empenho de seu coração.
Possivelmente estimulado pelo episódio de sua partida da Vila de Balisa, no dia 11 de janeiro de 1943, que sempre recordava com grande carinho, que relata em suas memórias e contou com detalhes a este articulista, acabou por tornar-se um autêntico “homem da Renascença”. O dia de sua partida foi um dia importante para a Vila de Balisa. Nunca antes um garoto da localidade tinha partido rumo a um seminário. Por isto Niversindo Cherubin foi acompanhado por um numeroso séquito até a estação ferroviária. Aos seus olhos, era uma multidão. Vieram despedir-se os parentes, os colegas da escola, os amigos e até muitos curiosos. E sua decisão de entrar para o seminário criou na comunidade o que o Pe. Cherubin definia como “clima vocacional”. Diversos outros garotos de Balisa seguiram seu exemplo. Sua mãe estava orgulhosa. Nos dias que precederam o embarque fazia questão de apresentá-lo como o membro da família que iria ser padre. O episódio o fez sentir-se importante para sua gente e disposto a empenhar-se para não os desapontar.
– CIDADÃO DO MUNDO
Convertido em cidadão do mundo, carismático, líder, educador e empreendedor, o Pe. Cherubin passou a aplicar seus conhecimentos em administração, contabilidade e auditoria para melhorar o desempenho de instituições de caridade e de saúde, tanto daquelas de sua ordem religiosa como de quaisquer outras dedicadas a causa do bem. Seu talento invulgar para organizar e obter resultados logo o fez destacar-se e o levou para dezenas de países ao redor do mundo. Seu desempenho e competência em solucionar problemas complexos e enfrentar desafios com serenidade e bom senso acabou por lhe angariar o respeito da Misereor, possivelmente a mais rica e generosa das organizações católicas do mundo. A entidade, que apoia ações de combate à pobreza na África, Ásia e América Latina, pertence a Igreja Católica da Alemanha e é dirigida pela Conferência dos bispos alemães. Pois foi precisamente a Misereor, com todo seu prestígio e influência, que recomendou ao Papa Paulo VI o nome do Pe. Niversindo Cherubin. O Sumo Pontífice acolheu a indicação e, na data de 4 de abril de 1977, formalizou sua nomeação como membro do prestigiado “Pontifício Conselho Cor Unum para a Promoção Humana e Cristã.
CONSELHEIRO DO PAPA
O Conselho “Cor Unum” era presidido por um cardeal e formado por 34 conselheiros convidados pelo Papa para duas tarefas: examinar a política da Igreja Católica no campo social e apreciar os critérios de distribuição de doações que chegavam ao Vaticano. Especialmente aquelas destinadas a mitigar os efeitos das catástrofes que ocorriam no mundo.
O Conselho funcionava com seu escritório central instalado no prédio do Vaticano, no mesmo andar da residência do papa. Por óbvias questões de segurança, o acesso era restrito e cada membro do conselho recebia uma credencial especial que dava acesso ao local.
– Missões e viagens a serviço da solidariedade
As atividades do Conselho eram intensas. As reuniões oficiais ocorriam anualmente, sempre em novembro, com duração de uma semana. No entanto, ao longo do ano, os membros eram enviados para participar de grupos de trabalho em diferentes países, contribuindo para definir a destinação de doações e para a formulação de políticas sociais e humanitárias, e, sendo enviados para representar a Igreja em várias iniciativas humanitárias.
– A proximidade com os Papas
O encerramento dos trabalhos do Cor Unum era marcado por cerimônias de grande significado, realizadas na sala de audiências pontifícia, sempre com a presença do Papa. Nessas ocasiões, o pontífice costumava concelebrar missa com os conselheiros e, em seguida, convidava-os para um café da manhã em sua companhia — momentos de comunhão e partilha espiritual que reforçavam o compromisso com a missão do conselho.
– Uma missão que atravessou pontificados
O falecimento do Papa Paulo VI, em agosto de 1978, seguido pela breve passagem do Papa João Paulo I, não interrompeu a trajetória de Pe. Cherubin no conselho. O Papa João Paulo II reconheceu a importância de sua contribuição e o manteve entre os conselheiros, permitindo que sua atuação se estendesse até 12 de junho de 1984. Assim, pelos sete anos de seu mandato, o Pe. Cherubin influiu nas decisões de caridade da Igreja e tornando-se um verdadeiro “Globe-trotter do Papa”, levando solidariedade e esperança aos lugares mais diversos do planeta.
O GLOBE-TROTTER DO BEM PROMOVENDO A EXCELÊNCIA
A reconhecida expertise demonstrada pelo Pe. Cherubin em auditar e reorganizar a vida administrativa e financeira das entidades e instituições o levaram a ser enviado por sua Ordem Religiosa para “arrumar a casa” nos cantos mais inesperados do mundo. A começar pelos Estados Unidos. Lá ele descobriu que seus colegas americanos não tinham a menor ideia do que fosse uma administração hospitalar profissionalizada. Depois de diversas controvérsias e repetidas visitas de religiosos brasileiros liderados pelo Pe. Cherubin, a Comissão Econômica Central da Ordem, em Roma, entendeu que o melhor a fazer era entregar de vez a gestão da Província Camiliana dos Estados Unidos para a comprovada competência da Província Brasileira. O que foi feito.
– A reestruturação administrativa da Ordem dos Padres Camilianos
Um dos problemas enfrentados pelos camilianos era seu sistema antigo de organização administrativo-financeira. A ordem tinha casas espalhadas nos mais diferentes cantos do mundo, mas vivia assolada por dificuldades que comprometiam sua missão religiosa. Em 1977 o Pe. Cherubin sugeriu a criação de uma diretoria financeira internacional para gerir sua área de economia e finanças. A convenção Geral da Ordem acatou a sugestão criando a “Comissão Econômica Central”. O Pe. Cherubin começou por unificar os demonstrativos contábeis segundo os procedimentos contábeis internacionais, fixando grupos de contas para o Ativo, o Passivo, as Receitas e Despesas. E estabeleceu que os demonstrativos anuais das províncias fossem assinados por três pessoas: o Padre Provincial, o Diretor Financeiro (o “Ecônomo”) e o Contador da Província. A ele foi atribuída a tarefa de fazer o exame prévio da situação financeira de todas as províncias camilianas do mundo e produzir um relatório a ser analisado pela Alta direção da ordem.
– Missões de aconselhamento, consultoria e reestruturação
Sua missão como o mentor administrativo dos camilianos de sua geração o levou à missões de aconselhamento, consultoria e reestruturação de instituições de muitos países, a começar pelos Estados Unidos, como já vimos, mas que incluem países do Extremo Oriente. Em 1988 recebeu a incumbência de avaliar a situação da Província Camiliana de Taiwan. Para esta missão convidou o Administrador Hospitalar Naírio Augusto dos Santos, que já tinha comprovado sua competência na gestão da Consultoria Hospitalar no Rio Grande do Sul. A viagem de ambos começou por Hong Kong, passou por Taiwan e se estendeu ao Japão.
Ainda 1988, nos meses de outubro e novembro, passou 40 dias em viagem para conhecer e avaliar as Províncias Camilianas da África. Visitou Burkina Fasso, Benin, Tanzânia, Quênia, Etiópia e Costa do Marfim. 
Entre os países que visitou a trabalho, em pesquisa ou em busca de conhecimentos, além dos já mencionados países de sua formação, como Itália, França, Bélgica, Holanda, Inglaterra, Alemanha, Portugal Espanha e o Canadá, Incluem-se a Rússia, a Suécia, Noruega, Irlanda, Islândia, Dinamarca (incluindo a Groenlândia), o México, Cuba e Guiné Bissau e Egito.
No período em que fez parte do Conselho Cor Unum visitou a totalidade dos países da América do Sul e a maioria dos países da América Central.
PRESIDENTE DA CONFEDERAÇÃO INTERNACIONAL DAS MISERICÓRDIAS.
Ao lado de suas atividades como religioso, o Pe. Cherubin atuou como dirigente das Santas Casas de Misericórdia brasileiras e na Confederação Internacional das Misericórdias, da qual foi eleito Presidente para o período de 2003-2005.
Sua principal atividade internacional na presidência da Confederação foi convocar e presidir o IV Congresso Internacional das Misericórdias, que foi realizado em Florença, na Itália, de 14 a 17 de outubro de 2004.
O Legado
O Pe. Cherubin dizia que preocupação de qualquer pessoa, desde o nascer, deve ser de deixar um legado que contribua para o aprimoramento dos seres humanos, da família, da comunidade, do país e do mundo. Se o universo habitado conseguiu aprimorar o desempenho das pessoas e se estas encontram a cada novo dia mais qualidade de vida, isso deve-se certamente a contribuição de pessoas que se preocuparam com deixaram um seu legado de exemplos, de conhecimentos e de obras. Victor Hugo disse, com muita propriedade, no seu livro “Os miseráveis” que a preocupação da pessoa deve ser sempre a de permanecer vivo entre nós, mesmo que ela já não esteja mais entre nós.
Victor Hugo indicava para tal elementos básicos que ela deveria atingir e materializar enquanto viva. Devia escrever um livro, fundar uma escola ou criar uma entidade. Em seus 51 anos como superintendente da Sociedade Beneficente São Camilo fomentou uma expressiva evolução na área da assistência à saúde brasileira, tanto na criação de hospitais quanto na de diversas outras entidades camilianas dessa área.
Quando assumiu como diretor administrativo do Hospital São Camilo Pompéia, em 1961, os camilianos mantinham no Brasil tão somente aquele hospital, parcialmente concluído, com capacidade de apenas 73 leitos. Cinquenta anos depois o Grupo São Camilo dispunha de 41 hospitais, 3.451 leitos, realizava anualmente 116.385 cirurgias 51.527 partos e 6.734.725 exames de diagnóstico. Criou os Cursos de Administração Hospitalar, plantou a semente do Centro Universitário S. Camilo e escreveu 12 livros que ainda são referencias na gestão hospitalar brasileira.
Seu pai, que faleceu tão precocemente, sua mãe, que o estimulou a buscar sua realização no sacerdócio, seus tios que custearam o seminário de Iomerê, os parentes, colegas e amigos que acompanharam o embarque de Niversindo Antonio Cherubin na estação da Vila de Balisa hão de estar orgulhosos, estejam onde estiverem, de fazerem parte da história de vida daquele menino que saiu de Balisa para conquistar o Mundo.
 
 

PARTE 6 – UMA ANDORINHA SÓ NÃO FAZ VERÃO – A SAGA DO PADRE NIVERSINDO CHERUBIN (O CRIADOR DAS FACULDADES DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL)

DE BALISA PARA O MUNDO – Parte 6

UMA ANDORINHA SÓ NÃO FAZ VERÃO

Quem não sonha não Faz. Por essa razão o Padre Niversindo Antonio Cherubin sonhava com hospitais perfeitos e com instituições modelares que acolhessem os enfermos com o mesmo desvelo e carinho com que Cristo e São Camilo de Lellis, o fundador de sua Ordem Religiosa, o fariam. E foi cultivando esse sonho com visão cristã e diligência infatigável que se tornou um dos maiores realizadores da história da saúde do país.

Ao longo de seis décadas incansáveis colocou os hospitais camilianos brasileiros entre os maiores do país, plantou a semente da Universidade São Camilo, ocupou a Coordenação da Assistência Médica e Hospitalar do Ministério da Saúde, criou o primeiro Curso de graduação em Administração Hospitalar no Brasil, organizou a FBH – Federação Brasileira de Hospitais, a FBAH – Federação Brasileira de Administradores Hospitalares, reorganizou administrativamente dezenas de hospitais e casas de caridade no Brasil e no mundo, inclusive as Obras da Irmão Dulce na Bahia e a Província Camiliana dos Estados Unidos, cumpriu missões para os Papas Paulo VI e João Paulo II e foi Presidente da  Confederação Internacional das Santas Casas de Misericórdia sob a ética da Civilização da Paz e do Amor.

Pe. Cherubin via sua vocação pelas palavras do apóstolo Tiago no evangelho: “A fé sem as obras é (fé) morta”. (Tg. 2,17). Então, para ser homem de fé ele precisava ser homem de obras. E obras de vulto, capazes de fazer diferença, acolher e cuidar de comunidades inteiras. Ora, obras desta magnitude não se fazem sozinhas. São obras complexas que só são viáveis quando realizadas coletivamente. O fato é que uma andorinha só não faz verão.

Uma frase de que o Pe. Cherubin gostava, tanto que a publicou em seu livro “A Arte de ser um Administrador Hospitalar Eficaz,” era de Sir Walter Scott: “A raça humana seria destruída se as pessoas parassem de se ajudar. Não somos capazes de sobreviver sem ajuda mútua”.

Por esta constatação o Pe. Cherubin entendeu que ser homem de obras era, antes de mais nada, buscar ajuda. E ajuda mútua era uma via de duas mãos: eu te ajudo e tu me ajudas. Por outro lado, a ajuda precisa ser útil. A ajuda que importa é aquela que funciona, ou, em um dizer mais elaborado, a ajuda eficaz. Que, trocando em miúdos, quer significar saber fazer, querer fazer e fazer! E esse tipo de ajuda não existe pronta. Por isso o Pe. Cherubin tornara-se um apóstolo da arregimentação, formação e motivação de profissionais de saúde, especialmente, administradores hospitalares, sem os quais não teria as obras hospitalares com que sonhava.

O Hospital, como dizia Peter Drucker, é a mais complexa organização já criada pelo homem. O seu corolário é que se trata de uma das organizações mais difíceis de administrar. De modo que o gestor hospitalar precisa ter um alto nível de competência para dar certo. E um dos requisitos da competência é estar atualizado com a evolução do setor. Aqui entendido do setor médico-hospitalar. Não por acaso, um dos setores da atividade humana que mais evoluíram nas últimas décadas.

Focado em resultados, o Pe. Cherubin era homem de objetivos e metas. Acreditava em estatísticas e evidências. E, por isso, acreditava na superioridade da medicina por evidência e no aprimoramento constante das boas práticas médico-hospitalares. E entendia que a medicina contemporânea é, a cada dia, mais multidisciplinar. Cada dia mais organizada por Protocolos Clínicos. Nem todos concordavam e muitos médicos diziam que o médico precisa ter liberdade para escolher a conduta de tratamento que desejar, mas a melhor conduta, aquela que comprovadamente obtém melhores resultados e reduz os custos hospitalares é a adoção dos Protocolos. (Essa visão, mais recentemente, foi também adotada pelo SUS, que estabeleceu os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas – PCDTOs.) Os Protocolos Clínicos são algoritmos que guiam os profissionais de saúde no diagnóstico, tratamento e prevenção de doenças, com base em evidências científicas e melhores práticas. Eles padronizam o atendimento, a prescrição dos exames, a medicação, garantindo maior segurança ao paciente, otimização de recursos e uniformização do cuidado em diversas situações, como nos tratamentos e na segurança do paciente. Sem dúvida, o médico ainda é o dono do diagnóstico, mas o tratamento é complementado por enfermeiras, psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, assim como por técnicos em exames de imagem, exames laboratoriais, biologia molecular, e agora com suporte da IA, além de outros. São equipes trabalhando de forma colaborativa e integrada para oferecer um cuidado mais completo e personalizado ao paciente. Essa união de conhecimentos permite uma visão mais holística do indivíduo, desde o diagnóstico até o tratamento e a recuperação, visando a saúde e o bem-estar integral. É como uma orquestra com naipes de cordas, madeiras, metais, percussão e coro. Eventualmente, o maestro da orquestra é o médico, o Diretor Clínico, mas, sem o administrador hospitalar, não existe a orquestra.

Como primeiro passo para encontrar colaboradores qualificados o Pe. pensou em organizar os profissionais da administração hospitalar em uma associação. O propósito seria a troca de experiências e o aprendizado mútuo. Ele havia frequentado o Curso de Pós-Graduação em Administração Hospitalar da Universidade de S. Paulo em 1967 e era ativo participante dos eventos e congressos de administração hospitalar da época, tanto no país como no exterior. E via que os cursos de pós-graduação da área vinham crescendo em todo o país. A esta altura, no início de 1971, ele continuava dirigindo o Hospital São Camilo, mas também era Presidente da Associação dos Hospitais do Estado de São Paulo, secretário do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Pesquisas Hospitalares, o IPH de seu amigo Jarbas Karman, e Diretor Executivo da Federação Brasileira de Hospitais. E estava intrigado pelo fato de que, apesar do aumento da presença de administradores hospitalares em congressos, reuniões e cursos, surgiam poucas propostas e parecia faltar uma visão comum que fosse compartilhada por esses profissionais.

Ele tinha visitado a Associação Americana de Hospitais, em Chicago e lá conheceu o the American College of Healthcare Executives (ACHE). Esta instituição era a entidade associativa profissional dos executivos da área de saúde dos Estados Unidos. E, inspirado nela, o Pe. Cherubin, fundou o Colégio Brasileiro de Administradores Hospitalares. O Estatuto Social foi aprovado dia 26 de fevereiro de 1971.

O Pe. Cherubin diz, em sua autobiografia, que o Colégio brasileiro teve uma ascensão meteórica. A entidade iniciou os Congressos de Administração Hospitalar e foi muito atuante, mas enfrentou turbulências criadas por desafetos do Pe. Cherubin, que acabaram superadas em 1994. Naquele ano o Colégio Brasileiro de Administradores Hospitalares mudou o nome para FBAH – Federação Brasileira de Administradores Hospitalares. A entidade é outro legado do Pe.Cherubin que perdura e, no presente ano de 2025, a FBAH realizou seu 44º Congresso de Administração Hospitalar e Gestão em Saúde em evento simultâneo à Feira Hospitalar 2025, que ocorreu de 20 a 23 de maio, em São Paulo.

ASSOCIAÇÃO DOS HOSPITAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO

Como já vimos, o Pe. Cherubin assumiu a direção do Hospital São Camilo em 1961. Seu empenho em viabilizar e fazer crescer o hospital deram grande visibilidade ao seu trabalho e em 1965 o São Camilo foi convidado para ingressar numa entidade associativa chamada “Associação dos Hospitais que Atendem à Previdência Social”. Os hospitais que faziam parte da entidade eram hospitais privados que tinham convênio de atendimento com a Previdência, convênio esse que o São Camilo também acabara de fazer.

Em 1967, no período que o Pe. Cherubin fazia sua pós-graduação, foi eleito presidente da entidade. Sua primeira providência foi propor a mudança do nome para Associação dos Hospitais do Estado de São Paulo e convidar mais hospitais para se associarem. Em um ano o número de hospitais associados passou de 150, o que permitiu pensar em adquirir uma sede própria. Para viabilizar o pagamento da sede o Hospital São Camilo antecipou o pagamento de dois anos de mensalidades. Logo o número de associados chegou a 415 hospitais de todos o estado e foram criadas Diretorias Regionais em Campinas, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Santos e no ABC paulista.

Durante sua gestão o Pe. Cherubin mostrou sua combatividade. Foram diversas lutas contra disposições dos governos da época, como foi na mudança das regras de pagamento aos hospitais, cujas glosas sistemáticas eram superiores a 30% e outras. Mas aquela que que mais repercutiu foi a sua liderança na luta contra a obrigatoriedade de envio, pelos hospitais, do prontuário dos pacientes junto com as contas. O absurdo da medida, um édito de índole medieval que violava a ética e o sigilo médico, acabou sendo uma discussão nacional. No fim, depois de grande debate, o governo foi forçado a voltar atrás.

FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE HOSPITAIS

Em 1967, ao assumir a presidência da Associação dos Hospitais do Estado de São Paulo, o Pe. Cherubin partiu para a ofensiva para garantir uma remuneração justa para os hospitais conveniados com a Previdência Social. O órgão que fixava os valores e os reajustes era o DNPS-Departamento Nacional de Previdência Social e ficava no Rio de Janeiro. A inflação do ano foi de 25% e o Pe. Cherubin passou a ir ao Rio todos os meses para reivindicar um reajuste condigno aos hospitais da Associação. Em uma destas visitas ao diretor do DNPS ouviu dele que não podia atender cada estado do país em separado. Ele que procurasse organizar as associações estaduais para facilitar a discussão em âmbito nacional.

Sem demora o Pe. Cherubin convocou as entidades estaduais então existentes para uma reunião no Rio de Janeiro. Vieram, além da do Rio Janeiro, as de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia e uma que aglutinava estados do Nordeste. Reunidas, fundaram a FBH – Federação Brasileira de Hospitais.

O Pe. Cherubin assumiu o cargo de secretário da nova Federação, entendendo que era mais prático deixar a presidência nas mãos de um carioca que morasse no Rio, próximo ao DNPS. De sua parte, saiu viajando país afora para criar associações estaduais e, em poucos meses, quase todos os estados tinham suas entidades próprias.

Criar a FBH foi uma medida providencial. Então, com a entidade devidamente robustecida, partiu para a luta. A inflação galopante exigia que ele, todo o início do ano, ficasse uma semana no Rio de Janeiro para calcular o aumento nos custos de internação hospitalar do ano anterior e dar ao governo o valor do reajuste que o Ministério da Previdência deveria aplicar.

Só que o governo usava mil subterfúgios para escapar dos necessários reajustes aos hospitais. E o Pe. Cherubin precisava gastar um tempo enorme nestas escaramuças com o governo. Uma arma que descobriu ser de grande efeito, e que passou a usar, foi a ameaça de promover uma greve e paralisar o atendimento. Quando não conseguia o que queria ameaçava com a suspensão do atendimento conveniado. O governo era muito sensível a esta ameaça pois, ao menos em São Paulo, a previdência estava na mão dos hospitais. Somente na grande São Paulo eram mantidos 149 postos de emergência operados por hospitais conveniados. E, naqueles idos, praticamente não existiam planos de saúde e as empresas não ofereciam assistência médica aos seus empregados.

E as refregas eram para valer. Certa feita, em reunião com o Ministro da Previdência, ao defender a causa dos hospitais, foi tão veemente em sua argumentação que o ministro perdeu a compostura, lhe jogou no rosto um maçudo caderno de classificação hospitalar e saiu furibundo da sala. O lado bom foi que, com medo da imprensa, atenderam o Pe. Cherubin em todo o que ele pedia…

Outra medida que lhe tomou muito tempo e precisou de movimentação nacional foi que o Ministério da fazenda passou a exigir dos hospitais acesso à sua contabilidade de custos para autorizar qualquer tipo de ajuste na remuneração. Foi uma correria sem tamanho. Naquele tempo o único hospital do país que mantinha contabilidade de custos organizada era precisamente o hospital São Camilo de São Paulo.

Inúmeros escritórios de contabilidade saíram oferecendo seus serviços para os hospitais, mas o Pe.Cerubin convenceu o Ministério a estabelecer uma padronização do plano contábil de custos e ofereceu o sistema do hospital São Camilo como modelo. O sistema estava sendo empregado há vários anos e com grande eficiência. A proposta foi aceita pelas autoridades e o sistema de custos do Hospital São Camilo foi distribuído para todo o país.

Atualmente, a FBH – Federação Brasileira de Hospitais ainda é atuante e representa 16 Associações Estaduais Federadas e que compõe uma rede de 4.500 estabelecimentos privados, entre instituições com fins lucrativos e instituições filantrópicas.

PARTE 5 – CONSULTORIA E GERÊNCIA HOSPITALAR – A SAGA DO PADRE CHERUBIN (O CRIADOR DAS FACULDADES DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL)

Consultoria e Gerência Hospitalar

O Pe. Niversindo Cherubin tinha 29 anos, em 1961, quando assumiu a direção geral do Hospital São Camilo de São Paulo. O jovem padre ficou um tanto assustado com a responsabilidade. Ainda mais quando descobriu que, dos 78 leitos, só havia três com doentes internados. Ficou mais sossegado ao saber que a escassez de doentes tinha solução. Ainda no mesmo dia da posse chamou os médicos para conversar. Ouviu suas queixas e garantiu que a coisa mudaria. E, de fato, mudaram. Daquele dia em diante, e pelos 30 anos que se seguiram, não teve mais problemas dessa natureza.

Uma coisa, porém, o Pe. Cherubin compreendeu logo: Hospital não é lugar para amadorismo e improviso. Então, reconhecendo que de gestão de hospital não entendia nada, mas que tinha a seu cargo um hospital que agora, mercê de Deus e dos médicos que traziam pacientes, vivia lotado, foi preparar-se. Frequentou todo tipo de curso sobre hospital. Fez curso de lavanderia, de assepsia e limpeza, de esterilização, de arquivo médico, de estatística, de contabilidade hospitalar, ente outros. Alguns desses cursos foram ministrados pelo Instituto que adotaria, no futuro, o nome de IPH. De todos os que frequentou, o curso do IPH que mais o impressionou foi o de lavanderia hospitalar. Ficou espantado. Ele nunca imaginara o tamanho da montanha de lençóis, fronhas, toalhas, jalecos, aventais, camisolas, campos cirúrgicos, panos e coisas que tais que era preciso lavar todos os dias. Aí, quando comparou as técnicas ensinadas no curso com aquelas que seu hospital praticava, se sentiu pré-histórico. Foi quando se aproximou do criador do IPH, o arquiteto Jarbas Karman, e pediu ajuda para modernizar sua lavanderia. E depois outras áreas do hospital.  

Em 1967 o Pe.Cherubin foi fazer uma pós-graduação de Administração Hospitalar na Faculdade de Saúde Pública, em São Paulo. Esse curso permitiu a ele ampliar sua visão do papel do hospital na saúde da sociedade e, por outro lado, compreender que os cursos de pós-graduação não eram o caminho para a formação da quantidade, e do tipo de profissionais, que os hospitais precisavam. Em seu entendimento, a saída seria criar cursos em nível de graduação.

Para viabilizar a criação de uma Faculdade de Administração Hospitalar foi conversar com seu amigo, o arquiteto e engenheiro Jarbas Karman, o fundador do Instituto Nacional de Pesquisas e de Desenvolvimento Hospitalares (INPDH) que, no futuro, mudaria para a sigla IPH.

O Instituto continuava dando diversos cursos hospitalares. Alguns, por convite do Pe. Cherubin, ministrados no próprio São Camilo. O Pe. Cherubin, vez ou outra, os assistia. Descobriu que eram uma fonte de recrutamento imbatível.

Ambos, o padre e o arquiteto, visionários, empreendedores e idealistas, em um Brasil que se abria para o mundo, decidiram somar forças. Formaram uma parceria que, embora improvável, teve profundo e duradouro impacto no setor hospitalar brasileiro.

O Arquiteto e Engenheiro Jarbas Bela Karman nasceu em Campanha, MG, em 13 de abril de 1917 e faleceu, aos 91 anos, em São Paulo, em 2 de junho de 2008. Foi engenheiro civil pela Poli (USP), em 1941, e arquiteto pela Poli (USP), em 1947. Titulou-se mestre em arquitetura hospitalar pela Universidade de Yale, nos EUA, em 1952, e participou do curso sobre infecção hospitalar do Prof. Carl Walter, em Kitchener, em Ontário, Canadá, em 1952.

Para dar a dimensão do papel de Jarbas Karman no setor hospitalar paulista basta dizer que ele foi o arquiteto técnico do Hospital Albert Einstein. Em 1953, como contou a esse articulista, Karman foi procurado pelo Dr. Manoel Tabacow Hidal, médico que liderou a criação do Hospital Albert Einstein e cujo consultório ficava no mesmo edifício de seu escritório, na Rua Xavier de Toledo, 210, no centro de São Paulo. O Dr Hidal perguntou ao Karman, já atuante no setor hospitalar paulista, se achava viável um novo hospital na cidade, a ser criado pela comunidade israelita de São Paulo. Karman teria respondido que sim, especialmente se fosse um hospital de padrão internacional. Deste primeiro contato nasceram diversos estudos, inclusive a avaliação de um terreno que estava sendo oferecido por uma pessoa da comunidade judaica. O arquiteto Jarbas Karman foi avaliar o terreno, próximo ao aeroporto de Congonhas, grande e magnificamente localizado. Mas que ele, após examinar as características do solo, opinou pela recusa. O terreno tinha grande quantidade de madeira soterrada e estava profundamente contaminado com cupins, cuja erradicação seria cara e problemática, podendo vir a infectar o hospital.

Foi em 1955 que o arquiteto e engenheiro Jarbas Karman criou o Instituto Nacional de Pesquisas e de Desenvolvimento Hospitalares (INPDH/IPH), tornando-se pioneiro na formação de profissionais ligados à área da saúde. Seu 1º Curso de Técnica Asséptica e de Esterilização foi ministrado no Instituto de Engenharia de São Paulo em 1955. Ainda naquele ano iniciou a publicação da revista “Hospital de Hoje”, publicada até 1969. Em 1973, então, no período que o Pe. Cherubin ocupava a Coordenação da Assistência Médico Hospitalar do Ministério da Saúde, associou-se a ele para implantar a primeira faculdade de Administração Hospitalar da América Latina, em nível de graduação. Esta sociedade durou 12 anos, com grande sucesso. Como vimos anteriormente, o Pe. Cherubin retirou-se da sociedade do IPH em 1986, com imensa tristeza, quando os camilianos, à sua revelia, decidiram ter uma Faculdade própria de Administração Hospitalar. Aconteceu que dois colegas camilianos, que ele colocara como professores no curso de administração hospitalar do IPH, mas que tinham visão política diferente da linha conservadora esposada por ele, se valeram do prestígio adquirido pelo curso do IPH e pelas instituições camilianas e, ainda mais, do terreno da Clínica Infantil do Ipiranga e dos recursos financeiros obtidos pela Sociedade Beneficente São Camilo, frutos do trabalho do Pe. Cherubin, e fundaram o Centro Universitário São Camilo. Este novo cenário tornava inviável criar no Brasil um Centro de Administração da Saúde, nos moldes do Krankenhaus, de Düseldorf, na Alemanha e que era o sonho do Pe. Cherubin.

De sua parte, o Pe. Cherubin, como religioso obsequioso, curvou-se às decisões da Província e viabilizou as condições institucionais para criar o Centro Universitário São Camilo. Também coube a ele, como ecônomo da Província, fornecer os recursos para o investimento inicial e, como superintendente da Sociedade Beneficente São Camilo, dar acesso ao valioso terreno de 40.000 m2 da Clínica Infantil do Ipiranga que, pela escritura de agregação, estava em sua alçada.

Por justiça, é preciso lembrar, 35 anos depois seu gesto de grandeza foi reconhecido. No dia 23 de setembro de 2010, o Pe. Cherubin recebeu o título de Doutor Honoris Causa do Centro Universitário São Camilo, das mãos do Pe. Leoncir Pessini, Provincial e Presidente das Entidades Camilianas do Brasil e do Pe. Christian de Paul de Barchifontaine, Reitor do Centro Universitário São Camilo.

O importante, para o Pe. Cherubin, foi constatar em vida que o seu legado permanece. Em suas memórias fez questão de registrar que em 2010 já existiam 37 faculdades de Administração Hospitalar espalhadas por todo o país, sendo 14 só em São Paulo. Mas ele lamentava que a maioria só oferecesse a Administração Hospitalar como opção nos últimos dois anos. A seu ver, era uma formação insuficiente. E ele tinha base para afirmar isso.

A CONSULTORIA DE GERÊNCIA HOSPITALAR

Em meados da década de 1980, vinha crescendo o número de instituições filantrópicas que entravam em contato com a Sociedade Beneficente São Camilo buscando orientação sobre gestão e contabilidade. Depois de considerar todos os lados da questão, na Assembleia Geral de julho de 1985 a Sociedade Beneficente São Camilo criou um novo Departamento denominado Gerência Hospitalar. Era um serviço de consultoria e terceirização. Seu escopo de atividades incluía efetuar diagnóstico da situação do hospital e de suas unidades administrativas, revisar e corrigir procedimentos administrativos, implantação de um plano contábil, criar um sistema de prestação de contas, organizar a tesouraria, estruturar o setor de pessoal e de materiais, e outros. Podia, ou não, incluir a gestão operacional da instituição ou estabelecimento.

Focando sua atividade inicial na região Sul, em 1988, quando foi criada a primeira filial em Novo Hamburgo, a Consultoria já tinha quatorze hospitais clientes na região, sendo oito no Rio Grande do Sul, quatro em Santa Catarina e dois no Paraná. Coube a essa unidade, em junho em 1990, assessorar a Universidade do Rio dos Sinos, Unisinos, em São Leopoldo, na grande Porto Alegre, na instalação da primeira Faculdade de Administração Hospitalar do Rio Grande do Sul.

ASSOCIAÇÃO DA OBRAS SOCIAIS DA IRMÃ DULCE

Em janeiro de 1990 foi inaugurada a filial da Gerência Hospitalar em Salvador, na Bahia. Em primeiro de maio de 1990 a unidade de Salvador assumiu a administração da Associação da Obras Sociais da irmã Dulce, canonizada em 13 de outubro de 2019, pelo Papa Francisco, tornando-se a primeira mulher brasileira a ser reconhecida como santa pela Igreja Católica, com o título de Santa Dulce dos Pobres.  

Suas obras sociais formavam um verdadeiro conglomerado. Envolviam o Hospital Santo Antônio, o Centro Geriátrico, o Centro para Excepcionais e a Colônia Simões Filho, para 350 crianças abandonadas. No início a irmã Dulce mostrou-se pouco à vontade com a contratação de uma consultoria de terceiros para a obra que ela sempre levara à frente sozinha, mas os empresários que a apoiavam financeiramente perceberam que a irmã, com o avanço da idade, já não conseguia controlar um complexo daquele porte com métodos precários e impuseram essa condição. No período em que a Gerência Hospitalar prestou seus serviços de consultoria o Pe. Cherubin ia à cidade todos os meses para fazer a prestação de contas. E sempre reservava um tempo adicional para passar informações e esclarecer quaisquer dúvidas que a irmã Dulce suscitasse. Após alguns meses ela via, maravilhada, como as boas práticas de gestão estavam transformando sua obra. Passou a aguardar a visita mensal do Pe. Cherubin com grande alegria e fazia questão de manifestar a ele, e aos patronos de sua obra, que estava muito feliz com o trabalho de consultoria que estava sendo realizado e, que, agora, graça a ele podia dormir tranquila.

O GOVERNO É A PEDRA NO MEIO DE CAMINHO

Como tudo o que o Pe. Cherubin se propunha a fazer, e em que se empenhava com paixão e competência, a consultoria de Gerência Hospitalar cresceu rapidamente. Mas, também é verdade que ele percebeu que, em meados da década de 1980, a maioria dos hospitais brasileiros começava a enfrentar sua crise de meia idade.

O conceito que temos hoje do estabelecimento hospitalar moderno, designação que compreende uma estruturação sistematizada, desde a formação do especialista, o planejamento das edificações e instalações, a seleção do equipamento, as normas da organização e de funcionamento, o regime econômico-financeiro, tudo isto se consolidou no Brasil a partir de meados do anos 40 do século passado. E surgiram novos hospitais por todo o país. Ordens religiosas, irmandades, governos municipais, médicos empreendedores criavam novos estabelecimentos, a maioria sem condições mínimas de sustentabilidade.

Nos anos 80, um grande número destes hospitais estava à beira da falência. Administrativamente eram uma tragédia. Os hospitais não tinham controle financeiro, não tinham controle de estoque e não sabiam faturar. Para os consultores era relativamente fácil resolver seus problemas. A implantação de controles mínimos permitia arrumar as contas do hospital em 90 ou 120 dias. O efeito foi explosivo. Os gestores comentavam: “a consultoria do São Camilo chegou lá e resolveu em 90 dias”. Então os hospitais começaram a formar fila na porta do Pe. Cherubin.

O problema, na outra ponta, era formar e qualificar administradores hospitalares para atender a estes hospitais.

A consultoria de Gerência Hospitalar passou a selecionar candidatos nos estabelecimentos que administrava pelo país e os selecionados recebiam bolsas de estudo integrais, em São Paulo. As bolsas incluíam a faculdade, alimentação, residência (os alunos no Hospital São Camilo da Pompéia, e as alunas, no Hospital São Camilo de Santana), e uma ajuda de custo para transporte e aquisição de material didático durante os quatro anos do curso. Logicamente, no fim do curso, havia a promessa implícita de um emprego em nível gerencial. Nos dez anos que durou o programa foram formados cerca de 250 administradores hospitalares bolsistas.

Em 1996 a consultoria de Gerência Hospitalar já estava administrando 80 hospitais, com um total de 7.981 leitos. 30 desses hospitais pertenciam aos camilianos e os demais eram geridos sob contrato. Esses números faziam da unidade de Gerência Hospitalar São Camilo uma das maiores administradoras de hospitais do mundo.

O problema é que apareceu o governo no meio do caminho. A extinção do INAMPS, o Instituto Nacional de Assistência Médica e sua substituição pelo SUS, Sistema Único de Saúde, mudou para pior a sistemática da remuneração dos hospitais. O governo, vendo que instituições como a São Camilo e as Santas Casas assumiam grande parte do atendimento do SUS, achou que elas, talvez por sua origem religiosa, recebessem dinheiro do Espírito Santo, tirassem dinheiro do poço ou escondessem dinheiro no colchão. Mudou as regras e simplesmente estrangulou o pagamento dos serviços prestados ao SUS. Com as receitas engessadas e os custos da medicina aumentando acima da inflação, a qualidade da assistência começou a sofrer e o sistema ficou comprometido. Diante dos riscos de insolvência e com o governo indiferente à realidade dos hospitais, os camilianos decidiram encerrar o departamento de Gerência Hospitalar e conservar apenas os hospitais próprios, que seriam administrados diretamente pela Sociedade Beneficente São Camilo, dirigida pelo Pe. Cherubin, retirando-se dos que administrava sob contrato.

Hoje, consolidados, os hospitais camilianos fazem parte do legado do Pe. Cherubin e continuam a seguir o carisma da Ordem de São Camilo de Lellis cuidando dos enfermos. Seus hospitais estão presentes em todo o país, sendo 14 estabelecimentos na região sul.

Os hospitais do Paraná são o Centro Hospitalar São Camilo e o Centro Hospitalar São Camilo Uvaranas – Ponta Grossa; Clínica Médica São Camilo e Hospital Regional de Caridade Nossa Senhora Aparecida – União da Vitória; Hospital e Maternidade Ribeirão do Pinhal – Ribeirão do Pinhal;

Os hospitais de Santa Catarina são o Hospital São Braz – Porto União; o Hospital São Camilo Imbituba – Imbituba; Hospital São Francisco – Concórdia; o Hospital Regional Helmuth Nass – Biguaçu; Hospital São Bernardo, – Quilombo; Hospital São Camilo Ipumirim – Ipumirim; Hospital São Pedro – Itá e o Hospital São Roque, em Seara.

Por fim, no Rio Grande do Sul, o Hospital Beneficente Santa Terezinha, em Encantado.

Mas a saga do Doutor Padre Niversindo Antonio Cherubin ainda vai continuar por mais capítulos, porque é preciso contar suas iniciativas na promoção das boas práticas na gestão hospitalar, sua missão para organizar a Província Camiliana Norte-americana, relatar sua consultoria técnica para as entidades camilianas da África e da Ásia, suas missões para os Papas Paulo VI e João Paulo II e outras histórias de longe e de perto, como a homenagem que recebeu da Assembleia Legislativa de Santa Catarina pelo seu trabalho na promoção de saúde na região coirmã do Alto Uruguai Catarinense.

PARTE 4 – A SAGA DO PADRE NIVERSINDO CHERUBIN – NASCE A PRIMEIRA FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL

NASCE A PRIMEIRA FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR DO BRASIL

O Pe. Niversindo Cherubin estava no auditório do Ministério da Educação, no Rio de Janeiro. Sentava-se na última fileira de poltronas. Preferia viver sua angústia e fazer suas preces da forma mais discreta possível, ainda que sua batina, eblazonada pela marcante cruz vermelha camiliana na altura do peito, o fizesse o personagem mais destacado do auditório.

Era a primeira vez que o Pe. Niversindo Cherubin, desde sua ordenação sacerdotal, 17 anos antes, em junho 1956, se deixava tomar por tão forte emoção. Ali, naquele dia 12 de junho de 1973, reunia-se o Conselho Federal de Educação e seus conselheiros, todos circunspectos cavalheiros, elegantemente vestidos, com exceção do padre salesiano José Vieira, que usava sua batina regular, iriam julgar o processo que poderia tornar realidade seu acalentado sonho de criar a primeira Faculdade de Administração Hospitalar no Brasil

No dia da reunião que julgaria seu processo o Pe. Cherubin chegara cedo. Era homem prático e de ação, sempre com agenda cheia. Mas desmarcara tudo. Aquele não seria um dia como os outros. Tinha o coração nas mãos. Desejava acompanhar o trabalho dos conselheiros de perto. Temia que seu projeto, como tinha visto acontecer com tantos outros, fosse bombardeado pelos conselheiros. O que o sossegava, mas só um pouco, foi que o presidente do Conselho, o dr. Roberto Santos, médico famoso e que, no futuro, seria eleito governador da Bahia e que se tornara seu amigo, o tranquilizara. Se despendesse dele, o novo curso de graduação para Administradores Hospitalares do Brasil seria aprovado. Reafirmou ao Pe. Cherubin que, de fato, no início tinha sido contra, seguindo a opinião da maioria de seus colegas que achava que a administração hospitalar deveria ficar restrita aos médicos, mas depois, após haver estudado o assunto em profundidade e após as diversas reuniões de esclarecimento que tivera com ele, se convertera em fervoroso defensor do projeto.

A agenda da reunião do Conselho tinha variados outros assuntos e, enquanto aguardava, o Pe. Cherubin procurava espairecer lembrando da extensa jornada de sonhos e lutas que o trouxera até ali.

No seu dia a dia como diretor do Hospital São Camilo o Pe. Cherubin sofria horrores com a falta de profissionais qualificados para gerir o hospital.  O dia a dia hospitalar é feito de centenas, milhares de micro-eventos e das mais diferentes atividades. E, ainda mais, as atividades hospitalares precisam se encaixar como as engrenagens de um relógio. A falta de um simples dente em uma engrenagem pode emperrar o mecanismo inteiro. Mas onde encontrar esses profissionais qualificados? Médicos e enfermeiras não eram o problema imediato. Existiam e bem-preparados. O gargalo era mesmo a falta de administradores. De pessoal para o meio de campo.

Ele, pessoalmente, já havia obtido sua pós-graduação em Administração Hospitalar na USP. E existiam outros cursos de pós-graduação no meio acadêmico. Mas, como observara em primeira mão, a pós-graduação formava administradores doutos, que mal comparando, atuavam no estilo de “médicos”, ou seja, administradores orientados para o diagnóstico e prescrição de receitas. Entretanto, a carência dos hospitais era de administradores do perfil de enfermagem, ou seja, profissionais tipo “enfermeiras e enfermeiros” que atuassem no dia a dia hospitalar botando a mão na massa. Cuidando de suprimentos, documentos, planilhas, ordens de serviço, logística. Enfim, fazendo a estrutura burocrática e organizacional funcionar.

Pode-se argumentar que toda empresa precisa de bons administradores, mas um hospital lida com vidas humanas. Erros aceitáveis numa fábrica convencional podem ter consequências graves num estabelecimento de saúde. E, para o Pe. Cherubin, os administradores faziam toda a diferença. Uma analogia recorrente é que, se um hospital pode ser comparado com uma orquestra formada por naipes de médicos, enfermeiras e profissionais de saúde conduzidos pelo Diretor Clínico, no papel de maestro, sem os administradores hospitalares não haveria orquestra. Simples assim. De modo que foi, precisamente, por constatar a importância essencial desse profissional que o Pe. Cherubin assumiu para si a missão de formar e organizar os administradores hospitalares que seu hospital precisava. E de que o Brasil carecia.

Neste sentido, seguindo o modelo norte-americano de organização profissional que conhecera em Chicago, já havia criado em 1971 o Colégio Brasileiro de Administradores Hospitalares. (Em 1994 a entidade ampliaria seu escopo de atuação e mudaria o nome para FBAH-Federação Brasileira de Administradores Hospitalares).

E na reunião daquele dia 12 de junho 1973 estava sendo decidido se o Brasil teria faculdades com cursos da graduação em Administração Hospitalar ou se o país iria continuar, como havia feito até então, improvisando e aceitando padrões de gestão hospitalar sofríveis e abaixo da crítica.

Quando chegou a vez do Conselho analisar o projeto do Pe. Cherubin o Presidente do Conselho Federal de Educação, o Dr. Roberto Santos, pelo sim e pelo não, tratou de usar de um artifício matreiro para prevenir eventual derrota: quando chegou a vez de votar o projeto do Pe. Cherubin, levantou-se e, justificando que precisava sair do recinto, convidou o Pe. José Vieira, um conselheiro que suspeitava votar contra o projeto do Pe. Cherubin, para assumir a presidência dos trabalhos. Aparentemente o Pe. Vieira não tinha nada contra seu colega religioso, o Pe. Cherubin, nem nada em particular contra a Faculdade de Administração Hospitalar. É que ele se opunha sistematicamente a todas as novas faculdades propostas, sem exceção. Mas neste caso, indicado para presidir a votação, aceitou a incumbência e deu sequência à pauta da reunião. Foi só então que percebeu qual o projeto lhe cabia colocar em discussão. Ora, na presidência dos trabalhos não podia nem participar da discussão e nem votar. Exceto para um eventual voto de minerva. Mesmo assim foi em frente e chamou a votação. Ninguém se manifestou contra e, desse modo, por unanimidade dos conselheiros presentes, estava aprovada a primeira Faculdade de Administração Hospitalar do Brasil.

Foi então que o Pe. Cerubin, como candidamente confessa em suas memórias, não conseguiu conter as lágrimas teimosas que sulcaram seu rosto. E nem tentou conte-las. Seu coração exultava de júbilo e chorar de alegria era celebrar aquele momento de triunfo e a superação.

A decisão do Conselho, encaminhada para o presidente da República Emílio Garrastazu Médici, foi devidamente assinada em 6 de dezembro de 1973.

Para sair da teoria para a prática o Pe. Cherubin decidiu começar as aulas de sua Faculdade de Administração tão logo possível. Como o prédio que ele estava construindo no Morumbi não estivesse pronto, iria utilizar salas do Seminário Camiliano da Pompéia.  Era uma solução provisória, mas possível, para acomodar no primeiro ano os 120 alunos por turma que haviam sido autorizados.

Na verdade, sempre pensando na frente, o Pe. Cerubin já cogitara em como, e onde, abrigar a Faculdade de Administração Hospitalar. Ele antevia replicar no Brasil o que vira funcionando na Alemanha. Um Centro de Administração da Saúde como o “Krankenhaus Institut” de Dusseldorf. Neste centro funcionariam, além da Faculdade de Administração Hospitalar as entidades representativas dos administradores hospitalares, seus órgãos de classe e outras instituições hospitalares.  Para tanto já havia se associado ao IPH de Jarbas Karman, para dividirem o investimento: os recursos viriam da Associação de Hospitais do Estado de São Paulo, da qual ele era presidente, e do IPH – Instituto de Desenvolvimento e Pesquisas Hospitalares.  

A Primeira aula da Nova Faculdade de Administradores Hospitalares foi marcada para o dia 1º de fevereiro de 1974. Seria um evento solene e memorável para marcar o início de uma nova era para o mundo hospitalar brasileiro.

E de certo modo o foi. Mas por motivo completamente diferente. Naquele dia uma das maiores tragédias da história da cidade interrompeu essa aula inaugural: o incêndio do Edifício Joelma, na região central de São Paulo. Neste incêndio morreram 187 pessoas e mais de 300 ficaram feridas.

Ao saber do ocorrido o Pe. Cherubin correu para o Hospital São Camilo para assumir pessoalmente o comando do atendimento às vítimas da tragédia. O hospital tinha uma localização que facilitava o encaminhamento dos feridos e foi inteiramente mobilizado para socorrer as vítimas.

Os 14 helicópteros mobilizados no socorro às vítimas apanhavam os pacientes em um heliporto improvisado nas proximidades do incêndio e os levavam até o Estádio do Palmeiras. Pousavam no gramado e, dali, as ambulâncias enviadas pelo exército, amplas e práticas, os levavam pelos dois quilômetros restantes até o hospital.

No hospital o Pe. Cherubin comandou a criação de um espaço para primeiro atendimento ainda na entrada e promoveu a liberação de um andar inteiro para a internação. Os pacientes que estavam internados foram transferindo para o prédio vizinho ou para outros andares e alguns, para quartos do seminário ao lado. Ele virou a noite trabalhando para garantir que tudo estava funcionando.

No dia seguinte, mesmo com toda a tribulação da véspera, as aulas começaram. O Pe. Cherubin tinha pressa.

Como esperado, assim que a Faculdade passou a funcionar regularmente começou a preparar uma elite de administradores hospitalares. Muitos desses administradores foram, desde logo, convidados a estagiar no São Camilo e, os que se destacaram, foram contratados.

O mais importante foi que, sabendo que podia contar com uma fonte contínua de administradores hospitalares qualificados, o Pe. Cherubin se sentiu encorajado a incorporar novos hospitais na rede camiliana.

Dez anos depois, em meados dos anos oitenta, muitos hospitais de entidades filantrópicas começaram a enfrentar dificuldades administrativas e financeiras e procuraram o São Camilo solicitando orientação técnica. A essa altura o IPH, a Faculdade do Pe. Cherubin, já tinha formado diversas turmas de administradores hospitalares, a maioria dos quais se associaram ao Colégio Brasilero de Administradores Hospitalares, a futura FBAH – Federação Brasileira de Administradores Hospitalares. Vendo nestes pedidos uma oportunidade para ajudar os hospitais filantrópicos e, ao mesmo tempo, uma oportunidade de trabalho para os seus alunos, o Pe. Cherubin reuniu-se com a equipe que administrava os hospitais já incorporados na rede camiliana. Queria ouvir a opinião de seu grupo de administradores sobre a possibilidade da rede camiliana assumir a gestão destes hospitais. Seu pessoal achou que era viável. O Pe. Cherubin, então, criou na rede São Camilo, um nova unidade que recebeu o nome de “Departamento de Gerência Hospitalar”.

A Diretoria de Gerência Hospitalar atuou durante 13 anos. Terceirizou a gestão e prestou consultoria a hospitais de todo o país. Em 1º de maio de 1990 assumiu a administração da Associação das Obras Sociais da Irmã Dulce, na Bahia. Ainda em 1990, a Gerência Hospitalar assessorou a Universidade do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, na instalação da primeira faculdade de Administração Hospitalar do Rio Grande do Sul. Promoveu a reabilitação financeira da Santa Casa de Belo Horizonte, um feito excepcional para um nosocômio de 1.300 leitos, que, graças a melhorias na gestão, reduziu de 16 para 8 os dias de internação média.  

Apesar de seu sucesso, ou até em razão dele, o Conselho Provincial dos Camilianos decidiu encerrar as atividades do Departamento de Gerência Hospitalar em 1998. A principal justificativa foi que a supressão do INAMPS (Instituto Nacional de Assitência Médica da Previdência Social) e a criação, em seu lugar do SUS – Sistema Único de Saúde, ampliava a complexidade da administração financeira dos hospitais que atendiam o governo e recomendou que a Sociedade Beneficente São Camilo concentrasse seus esforços na gestão dos seus hospitais próprios. O Pe. Cherubin, então, organizou uma transição dos hospitais terceirizados que desejassem para a Pró- Saúde, uma entidade que foi criada pelos administradores hospitalares que administravam o Departamento de Gerência Hospitalar.

Ao encerrar seus 13 anos de atividades os números do último ano da Gerência Hospitalar falam por si:

– 80 hospitais sob administração terceirizada; 7.981 leitos hospitalares; 1.734.339 pacientes-dia-ano; 165.356 cirurgias-ano; 63.647 partos-ano; 4.143.570 exames diversos; 2.045.664 consultas; 7.217 funcionários; 6.148 médicos.

As dezenas de faculdades de Administração Hospitalar hoje espalhadas por todo o país e a FBAH – Federação Brasileira de Administradores Hospitalares e sua intensa atividade em Simpósios e Congressos voltados para o aperfeiçoamento profissional dos administradores associados estão no centro do legado que o Pe. Niversindo Cherubin deixou para os hospitais e para a saúde brasileira.

PARTE 2 – A MISSÃO NO GOVERNO FEDERAL – A SAGA DO PADRE NIVERSINDO CHERUBIN (CRIADOR DAS FACULDADES DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL)

A SAGA DO PADRE CHERUBIN
MISSÃO NO GOVERNO FEDERAL
Em abril de 1973 o Pe. Cherubin foi nomeado para atuar como Coordenador da Coordenação da Assistência Médico-Hospitalar do Ministério da Saúde. Nunca um padre havia sido chamado para atuar em função tão importante no Ministério da Saúde. Mas também nunca um padre tinha sido presidente da Associação dos Hospitais de São Paulo, cargo que o Pe. Cherubin ocupava na ocasião.
Sua indicação se deveu a uma combinação de fatores. A entrevista com o Ministro Delfin Netto para liberar recursos para o Programa Nacional de Controle do Câncer ensejou a oportunidade para uma conversação mais ampla sobre o estado de coisas do setor hospitalar brasileiro. O Ministro da Saúde era o médico Mário Machado de Lemos, que tinha sido Secretário de Saúde de São Paulo, e que era amigo do prof. João Sampaio Góes Junior, o médico que levou o Pe. Cherubin ao ministro Delfin Netto. O ministro conhecia o trabalho de seu amigo e, por meio dele, conhecia o trabalho do Pe. Cherubin. Assim, quando o Presidente Médici se interessou pelo assunto da coordenação dos hospitais e o nome do Pe. Cherubin foi aventado, o endosso das referências elogiosas o levaram ao cargo.
A nomeação do Padre Cherubin foi muito festejada pelo setor. Em primeiro de maio de 1973 a Associação dos Hospitais do Estado de São Paulo publicou, no Jornal O Estado de S. Paulo, um comunicado que incluía um convite para um jantar para celebrar a nomeação a ser realizado no dia 25 daquele mês. Após um preâmbulo com detalhes da publicação no Diário Oficial enumera as qualificações do homenageado:
“O padre Niversindo Antônio Cherubin é formado em Administração Hospitalar, foi um dos fundadores e secretário geral durante 5 anos da Federação Brasileira de Hospitais, ocupa há 5 anos o cargo de presidente da Associação dos Hospitais do Estado de São Paulo, foi um dos fundadores e é atualmente diretor do Colégio Brasileiro de Administradores Hospitalares, fundou e é diretor responsável e redator da revista Vida Hospitalar e dirigia, como superintendente, a Sociedade Beneficente São Camilo e o Hospital São Camilo desta capital e é o Diretor Geral do Curso de Administração hospitalar do INPDH – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e de Pesquisas hospitalares, do qual é vice-presidente.” Assina o Dr. Cícero Aurélio Sinisgalli, Presidente em exercício.
O Pe. Cherubin, em seu discurso de posse, disse que faria o possível para melhorar a situação dos hospitais e reconheceu que os hospitais brasileiros navegavam sem rumo, afirmando que careciam de normas técnicas e administrativas para a sua construção, operação e administração.
Após o discurso, muito elogiado pelo ministro, foi conduzido ao seu gabinete, que ainda não conhecia. Ali foi informado que seu antecessor não faria a transferência de cargo porque não gostou de ser substituído. Tanto que havia abandonado o cargo uma semana antes de sua chegada. O Pe. Cherubin teve que descobrir sozinho o que aquela coordenadoria fazia conversando com cada um dos seus 80 funcionários.
Como o Ministério da Saúde ainda ficasse no Rio ele precisou deixar a administração do hospital São Camilo de São Paulo, mas não foi morar no Rio de Janeiro. Mesmo com direito a hospedagem cinco estrelas no Copacabana Palace, hospedava-se de segunda à sexta-feira na casa dos camilianos, no bairro da Tijuca, e nos fins de semana, voltava a São Paulo, para dar suas aulas no INPDH, o que fazia na sexta-feira a noite e nos sábados.
O Pe. Cherubin, como todo mundo, já havia ouvido falar da pouca “voglia” dos funcionários públicos brasileiros, mas, ainda assim, habituado a ética de trabalho do Sul, da Itália e em empresas e hospitais privados, ficou abismado com a desfaçatez dos funcionários públicos de sua coordenadoria. Ele nunca havia trabalhado em órgão público e não estava familiarizado com a burocracia e a tramitação de processos, mas ficou espantado com a lentidão e a morosidade com que eram feitos os encaminhamentos e pareceres. Esse descaso era, de todas as barbaridades com que foi se deparando no serviço público, aquele que mais o incomodava. Constatava que os funcionários eram regiamente pagos, com o dobro ou triplo do que recebiam os do setor privado, gozavam de privilégios escandalosos e, mesmo assim, tinham uma atitude de absoluta displicência com suas tarefas e obrigações. Reclamando com um advogado de São Paulo ficou sabendo que essa atitude é conhecida como “desídia” e abrange desde a falta de comprometimento e atrasos constantes até a realização de tarefas de forma descuidada ou a eventual falta de educação com os cidadãos. Como nunca tinha ouvido falar nisso o advogado explicou que era tão raro alguém ser acusado de “desídia” que muitos juízes nem sabiam do que se tratava.
Mesmo sabendo que fazia uma declaração de guerra, informou aos responsáveis de seu setor que nenhum processo passaria a noite na mesa de seu gabinete e nenhum atravessaria uma semana na sua coordenadoria.
Teve outro espanto quando descobriu que nenhum dos seus funcionários havia sido selecionado e contratado pela sua coordenação. Todos, sem exceção, eram provenientes de outros órgãos federais, enquanto os que foram contratados por sua coordenação estavam trabalhando em outras divisões, inclusive em outros ministérios. Soube que, para requisitar ou transferir um funcionário, bastava o próprio servidor e seu chefe fazerem um simples memorando e obter o “de acordo” da outra parte. Outra coisa que o fez cair sentado foi quando disseram a ele que a orientação era para que nenhum órgão do Ministério deixasse de gastar a totalidade da verba prevista no orçamento do ano. Todo mundo tinha que gastar tudo, até o último tostão, mesmo que em bugigangas, porque caso não o fizesse, sofreria redução proporcional no orçamento do ano seguinte.
Depois de recuperar-se do assombro, o Pe. Cherubin fez um levantamento do que sua área precisava em equipamentos e suprimentos e saiu peregrinando pelos gabinetes do ministério. Apresentava-se e perguntava se havia verba sobrando. Habilidoso, explicava sua missão, mostrava sua lista de necessidades e pedia que comprassem algo do que precisava com sua gordura de verbas. Então, assim que os equipamentos ou suprimentos chegavam, ele ia pessoalmente agradecer e fazer um memorando solicitando que as mercadorias ou os equipamentos recebidos fossem cedidos para a sua coordenadoria. Acabou fazendo amigos e equipando sua área com tudo do bom e do melhor.
No Ministério da Saúde inteiro a tolerância em relação à frequência dos funcionários era total. O secretário da saúde do Ministério apresentou a ele uma senhora informando ser sua secretária e dizendo que qualquer assunto da coordenadoria poderia ser encaminhado diretamente para ela. A secretária, muito solícita e sorridente, se colocou à disposição, mas foi logo informando que não vinha trabalhar às quartas-feiras porque precisava fazer a feira…
Os médicos, então, esses eram de uma pontualidade nunca vista. No sentido de que nunca ninguém jamais a tinha visto. Pontualidade? Não sabiam o que era e nem queriam saber. Vinham trabalhar se, quando e como queriam. Para tentar por ordem no barraco o Pe.Cherubin determinou que, daí em diante, os médicos assinassem o ponto na frente de sua secretária. Seria da responsabilidade dela colocar o horário de entrada e de saída e, em caso de não comparecimento, fazer o traço em vermelho para cortar o ponto e descontar do pagamento.
Foi uma conflagração. Um médico, proprietário de um hospital no interior do Rio de Janeiro e que era o presidente da associação médica do estado, figurão empoado que mais tarde seria eleito prefeito da cidade de Niterói, comparecia ao serviço apenas uma vez por semana e, mesmo assim, por poucas horas. O Pe. Cherubin solicitou a ele que pedisse demissão para colocar em seu lugar alguém disposto a trabalhar todos os dias.
O médico fez cara feia, mas temendo que sua “desídia” se tornasse pública, redigiu o pedido. Todavia, conhecedor dos meandros e maroteiras que regem as sinecuras do serviço público, ato contínuo, fez a notícia de sua demissão espalhar-se pelo Ministério como rastilho de pólvora. O telefone do Pe. Cherubin não deu mais sossego: todos os diretores e vice-diretores, todos os chefes e subchefes do Ministério ligaram pedindo para que ele voltasse atrás. Argumentavam que ter aquele médico na folha de pagamento, por si só, já engrandecia o Ministério da Saúde, mesmo que ele não aparecesse para trabalhar.
Apesar do alarido, o Pe. Cherubin, educado na linha de que quem não trabalha não come, foi ao ministro da saúde com o pedido de demissão do médico. O ministro o recebeu sabendo do assunto. Mostrou-se muito educado e compreensivo, mas fez o Pe. Cherubin se sentir o próprio Dom Quixote investindo contra os moinhos de vento. Demitir aquele médico era comprar problemas e ele não tinha virado ministro fazendo inimigos.  
O Pe. Cherubin, porém, nunca esmoreceu ante as dificuldades. O que ele tinha dito no discurso de posse era no que acreditava: os hospitais brasileiros careciam de normas técnicas e administrativas para a sua construção, operação e administração.
Administrador proficente que era, o Pe. Cherubin conhecia a máxima de Edward Deming, “Você não pode administrar aquilo que não pode medir”. O Pe. Cerubin, assim como Deming, acreditava que, para tomar decisões corretas você precisa saber onde está pisando. E ninguém, no Ministério da Saúde, tinha a menor ideia do tamanho e da localização dos hospitais brasileiros. Mais grave, o governo brasileiro não tinha conhecimento de quais eram, como eram e onde estavam os seus hospitais públicos.
Tentando encontrar essa informação o Pe. Cherubin descobriu, com surpresa, que o Ministério da Saúde, sim, até tinha uma Seção de Estatística. Estava enfiada no fim de um corredor. Ele foi lá e soube que a seção tinha alguns milhares de fichas de hospitais cadastrados, colocadas em gavetas de fichários. Também descobriu que, todos os anos, o departamento enviava aos hospitais cadastrados um formulário solicitando informações para atualizar o censo hospitalar. Salvo exceções, os hospitais dedicavam uma dezena de horas para responder as questões constantes do formulário. Depois, postavam no correio, escrupulosamente, para cumprir o prazo estipulado. E o Ministério recebia os formulários e os empilhava, formando uma montanha de papel que ficava tomando pó em um canto da repartição. E nada mais fazia com eles. Não tabulava as informações. Não produzia relatórios. Não analisava. E, como os formulários não produziam dados úteis, deles não vinham informações para a tomada de decisões e, é óbvio, nem para definir políticas. Era tudo de mentirinha. Para um incrédulo Pe. Cherubin, que falava francês com fluência porque, durante as férias do seminário, tinha ido trabalhar na França para ganhar algum dinheiro, aquela encenação de censo hospitalar soava como coisa feia só para “épater les Bourgeois”, ou seja, para embasbacar a “burguesia”.
O Pe. Cherubin ficou uns dias dando tratos à bola sobre o que fazer com os formulários relativos a 1971 que aguardavam empoeirados. Tentar fazer a tabulação com aquele pessoal que o olhava com hostilidade brilhando nos olhos era pura perda de tempo.
Então, deu-se a “Eureka”. Pegou os formulários e os levou para São Paulo, onde encarregou seus alunos, os estudantes de Administração Hospitalar do INPDH, para fazerem, em mutirão, a tabulação e a transcrição dos dados.
Finda a tabulação as planilhas mostravam que o Brasil dispunha, em 1971, de 4.067 hospitais, sendo 3.407 particulares e 660 oficiais. Tinha 367.522 leitos, sendo 242.921 em hospitais particulares e 124.601 em hospitais públicos.
Os dados compilados pelos seus estudantes foram reunidos em uma publicação sofisticada, feita com papel couchê e capa dura, no chamado “tamanho de mesa”. O miolo tinha 300 páginas e era ilustrado com abundantes imagens e gráficos. A publicação foi denominada “Cadastro Hospitalar Brasileiro” e teve uma tiragem de 1.000 exemplares que se esgotaram em dias porque era a primeira vez que o setor tinha acesso a um panorama tão completo sobre a situação hospitalar Brasileira.
Quando o Pe. Cherubin levou um exemplar encadernado ao Ministro da Saúde ele o folhou maravilhado. Mandou chamar todos os coordenadores do Ministério para mostrar a obra. Em seguida pediu mais um exemplar para entregar ao presidente da República.
O segundo trabalho que o Pe. Cherubin se propôs a fazer era mais complicado. Tratava-se de elaborar as normas técnicas para a construção de hospitais no Brasil. Essa era uma tarefa urgente porque, na falta de normas, cada dono de hospital, cada arquiteto e cada construtor hospitalar tentava reinventar a roda. Algumas das rodas eram até redondas, mas as havia de todas as formas. Até as quadradas, que, como na antiga piada, eram substituídas por outras quadradas quando gastavam-se os cantos…
A equipe encarregada de produzir aquele trabalho histórico foi formada por 4 engenheiros, 4 arquitetos hospitalares, 20 consultores técnicos e 4 desenhistas. Após mais de um ano de trabalho exaustivo foi publicado o Manual de Normas de Construção e Instalação do Hospital Geral. Como exemplo do nível do detalhamento, o capítulo dedicado aos componentes das instalações elétricas, hidráulicas, mecânicas e especiais, que incluíam as instalações de oxigênio e gases hospitalares, traziam um memorial descritivo e os parâmetros a serem minimamente observados para o funcionamento do Hospital. Era o primeiro Manual de Normas hospitalares do Brasil e foi copiado em toda a América Latina. Sua consistência técnica, adotada como padrão no país, ajudou a projetar a arquitetura hospitalar brasileira. O arquiteto e engenheiro Jarbas Karmann e o arquiteto e médico Domingos Fiorentini, colegas do Pe. Cherubin na Faculdade de Administração Hospitalar, atuaram como consultores para a definição das normas. Como resultado, tornaram-se referências internacionais em arquitetura hospitalar e projetaram, em conjunto ou separadamente, mais de 1.000 obras hospitalares no Brasil e em várias partes do mundo. Graças ao prestígio internacional, em 2008 o arquiteto e engenheiro Jarbas Karman trouxe para o Brasil o IX Congresso Internacional de Engenharia e Arquitetura Hospitalar.
Tive oportunidade de presenciar pessoalmente a abertura do Congresso, realizado no auditório do Hospital Albert Einstein. Na oportunidade o Pe. Cherubin foi convidado para a mesa e foi reconhecido pela publicação do Manual de Normas, sendo aplaudido de pé pela plateia formada por centenas de arquitetos e engenheiros hospitalares vindos dos quatro cantos do globo.
Durante a permanência no Ministério da Saúde o Pe. Cherubin querubim foi também nomeado diretor do Instituto de Previdência do Clero, que tinha sede no Rio de Janeiro. Nessa função, o Pe. Cherubin foi esmiuçar as finanças da entidade. Ficou horrorizado. Ele mesmo contribuía para o instituto e viu que, a depender do que tinha verificado, nunca conseguiria se aposentar. Na primeira reunião da diretoria, sob a liderança de Dom Aloísio Lorscheider, foi incisivo: “senhores, com todo o respeito, eu posso afirmar que o balanço que acaba de ser lido não é verdadeiro e contém informações inverídicas”. Todos ficaram atônitos e o monsenhor Tapajós, que cuidava das finanças, reconheceu que, de fato, a instituição não tinha como se sustentar com as próprias pernas. Diante da dura realidade mostrada pelo Pe. Cnerubin o instituto recorreu ao governo federal e o Ministério da Previdência e Assistência social baixou o ato criando legislação específica para a aposentadoria dos religiosos e religiosas.
Em junho de 1974, enquanto ainda no governo, recebeu convite do Ministério da Saúde britânico para conhecer os serviços de saúde da Inglaterra. Lá permaneceu 15 dias e voltou bem impressionado com o padrão de assistência médica dispensado gratuitamente a toda a população do país. Especialmente a forma como atuam os médicos de família. Encaminhou relatório recomendando medidas para fortalecer esta forma de atenção à saúde.
No dia 26 de junho de 1975 o Pe. Cherubin recebeu um ofício do Pe. Calisto Vendrame, o Provincial dos camilianos, solicitando que ele pedisse demissão do Ministério da Saúde e voltasse com urgência para administrar o hospital São Camilo de São Paulo, que estava enfrentando sérios problemas de gestão. Sendo religioso, devia atender ao chamado. O Ministro da Saúde lamentou a decisão, agradeceu pela obra realizada pelo Pe. Cherubin e nomeou seu assistente, Dr. Augusto de Abreu Amorim, para o substituir.
 

PARTE 1 – DE BALISA PARA O MUNDO – A SAGA DO PADRE NIVERSINDO CHERUBIN (CRIADOR DAS FACULDADES DE ADMINISTRAÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL)

De Balisa para o Mundo – Primeira Parte

Resumo biográfico de Niversindo Antonio Cherubin, padre camiliano nascido na Vila de Balisa em 30 de setembro de 1931 e que morreu aos 92 anos, em 15 de setembro de 2023, em São Paulo. Esta é a fascinante história de uma vida dedicada ao aprimoramento do setor de saúde ao redor do mundo por meio da melhoria das boas práticas em administração e finanças. É a história do legado de um filho de Erechim que viajou pelos quatro cantos do mundo para divulgar conhecimentos, realizar missões junto a hospitais e entidades camilianas nas américas, na Europa, e no Oriente e como enviado dos Papas Paulo VI e João Paulo II.

Existem homens cuja visão, talento e capacidade realizadora lhes dão fama e fortuna. Muitos deles apreciam o proscênio e buscam brilhar nas altas esferas midiáticas e sociais. Existem outros, contudo, dotados de igual visão, talento e capacidade realizadora, que preferem a consciência do dever cumprido.

Niversindo Antônio Cherubin figura neste segundo grupo. Homem de visão e de ação, era dono de cultura excepcional e focado em resultados. Trabalhador incansável, realizador, mas disciplinado, não descuidou de sua formação pessoal. Além de teólogo de formação fez pós-graduação em Administração Hospitalar na Faculdade de Saúde Pública, em São Paulo e, no afã de seguir a regra de ouro da administração, “aprendas a fazer para poderes mandar”, fez contabilidade e todos os cursos ligados à operação hospitalar que encontrou, desde lavanderia hospitalar a técnicas de esterilização e logística. Graças a esta diversidade de interesses e conhecimentos nas áreas de gestão e finanças, somadas à seu talento como poliglota, músico, editor de livros e revistas, autor de mais de 12 livros e centenas de artigos, especialmente em administração hospitalar, tornou-se um autêntico “polímata”, o termo que define o chamado “Homem da Renascença”, ou “homem universal”, aquele dotado de múltiplas habilidades e vasto conhecimento em múltiplas áreas.

Niversindo Antonio Cherubin tinha 12 anos quando embarcou na estação da Vila de Balisa no trem que o levaria para para o seminário Camiliano em Iomerê, Santa Catarina. Nunca, nem por um minuto, arrependeu-se de seguir sua vocação religiosa. Começou estudando no seminário em Santa Catarina, depois em São Paulo e, por fim, foi cursar teologia na Itália, onde, aos 24 anos, tornou-se sacerdote católico. A cerimônia de ordenação foi realizada na diocese de Pádua, no dia 17 de junho de 1956, dia de Corpus Christi. Alguns dias depois, já padre recém ordenado, começou os preparativos para voltar ao Brasil. Foram dias de regozijo pelo objetivo alcançado, mas, como revela em sua autobiografia, entremeados pela tristeza de imaginar que estava deixando para trás a terra de seus ancestrais. A bela e luminosa Itália que cativara sua alma sensível e que aprendera a amar profundamente. Temia que, talvez, para lá só pudesse retornar em seus sonhos e memórias, como aconteceu a tantos dos emigrantes vindos para o Basil.

Em seu caso, por felicidade, esse foi um temor totalmente infundado. Ao longo de seus profícuos 68 anos de atividades, como camiliano e arauto da administração, tantos foram os encargos e missões recebidas ao redor do mundo que viajou pelos quatro cantos do planeta e, na azáfama de suas incumbências, raros foram os anos em que não precisou voltar uma ou mais vezes à Itália de seus ancestrais.

O que aconteceu foi que, tão logo retornou ao Basil, foi chamado a colocar seu imenso talento e notável capacidade realizadora a serviço do carisma religioso da Ordem Camiliana, a organização religiosa a que pertencia e que é conhecida como a “Ordem dos Ministros dos Enfermos”.

PRIMEIRAS INCUMBÊNCIAS.

Para surpresa do recém ordenado Pe. Cherubin, ao invés de ser enviado para o interior acabou designado para atuar na Paróquia de Nossa Senhora do Rosário, na Vila Pompéia, na cidade de São Paulo. A Paróquia ficava, e ainda fica, ao lado do Hospital São Camilo. Na época esse era tão somente um acanhado hospital de bairro e não o portentoso nosocômio que a competência como administrador e o toque de midas do Padre Cherubin deu origem a um dos maiores e mais bem avaliados hospitais paulistanos. A instituição líder da rede camiliana brasileira, que, atualmente, possui quatro hospitais na capital paulista, somando mais de 750 leitos de alto padrão, além de dezenas de hospitais espalhados por todo o país, inclusive com unidades próximas a Erechim, nas cidades de Concórdia e Seara, em Santa Catarina.

Inicialmente, entre suas funções na paróquia estava a de celebrar as missas diárias, sendo duas aos domingos e, aos sábados, tocar órgão nos numerosos casamentos festivos realizados na paróquia. O órgão era um Hammond elétrico, igual ao da antiga Matriz S. José, de Erechim. No instrumento de sonoridade equivalente ao dos órgãos de tubos, equipado com dois teclados e pedaleira, o Pe. Cherubin tocava a Marcha Nupcial, durante a entrada da noiva, e a Ave Maria, de Gounod ou Schubert, segundo a preferência dos noivos, durante a bênção das alianças. Essas eram as músicas tradicionais. A Ave Maria, inclusive, usualmente era cantada pelo Pe. Contardi, um tenor lírico de bela voz, que invariavelmente era aplaudido pelos presentes. Outras músicas do repertório religioso ou clássico e, mesmo, popular, que combinassem com a cerimônia, podiam ser solicitadas. O fato dos casamentos da paróquia serem musicados pelos padres passou a atrair muitos casais interessados naquele diferencial e era preciso agendar a data com meses de antecedência. Os noivos também costumavam ser generosos na gratificação aos músicos. Para a igreja da Pompéia, que vinha lutando por recursos, aquela era uma ajuda muito bem-vinda.

Outra incumbência que Pe. Cherubin recebeu, tão logo chegou, foi a de dirigir a revista “A Cruz Misteriosa”. O título era uma alusão a enorme e chamativa cruz vermelha que os camilianos ostentam no peito de suas batinas. Eu me lembro da primeira vez que a vi. Eu deveria teria uns dez, onze anos. Um padre vestindo batina com a grande cruz vermelha bordada na altura do peito entrou na loja de meus pais. Soube, tempos depois, por minha mãe, que aquele padre que vestia a batina com a cruz tinha ido lá para apanhar a chave do órgão da Matriz S. José. A chave ficava com minha mãe por ela ser a organista oficial da igreja e tocava nas missas e cerimonias solenes e nos casamentos. Ligando os pontos, imagino que esse padre tenha sido o Padre Cherubin. Pena que nunca tenha lembrado de confirmar com ele.

O fato é que, quando recebeu missão de cuidar da publicação oficial dos camilianos no Brasil a revista era de tamanho pequeno e tinha 24 páginas. Sua impressão era feita em uma pequena gráfica instalada no porão da igreja. Apesar do nome pomposo de “Artes Gráficas S. Camilo”, só imprimia a revista e alguns impressos usados pela comunidade. O Pe. Cherubin achava que a publicação não estava à altura da imagem que os camilianos precisavam projetar no Brasil para crescerem no país. Por isso iniciou um grande esforço para angariar assinaturas e melhorar o conteúdo editorial. Um ano depois, graças a seu empenho, a revista passou a ter o tamanho de 20 x 30cm, padrão da época, e 64 páginas. O número dos assinantes subiu para mais de 30 mil. As assinaturas eram vendidas por estudantes católicos em campanhas pelos bairros e pelo interior do estado. Nestas campanhas, organizadas pelo Pe. Cherubin, ele ia junto com os jovens para vender assinaturas. Excelente vendedor, ele se encarregava de vender de 30 a 40 assinaturas por dia. Nessas ocasiões ele aproveitava para conversar com o público leitor para saber a opinião que tinham sobre a revista e sobre suas pautas.

Vendo o progresso notável da revista, o Provincial dos Camilianos entregou a direção de toda a gráfica para o Pe. Cherubin. A partir daí o progresso foi vertiginoso. Usando sua proverbial criatividade, a primeira providência foi aproveitar os numerosos noivos que vinham marcar casamento na igreja, a mesma que estava na moda graças aos seus padres músicos. Como era sabido que as reservas de data tinham que ser feitas com muita antecedência, raros eram os noivos que já tinham mandado fazer os convites. Então o Pe. Cherubin montou um amplo mostruário dos elegantes convites de casamento que a gráfica camiliana oferecia e o colocou estrategicamente na sala da secretaria onde eram marcados os casamentos. O resultado foi que a venda de convites deu um salto, exigindo mais máquinas e mais pessoal.

Logo, por um golpe de sorte, o Pe. Cherubin soube de uma impressora automática que tinha dado defeito e estava encalhada no porto do Rio de Janeiro. Foi ao Rio e conseguiu arrematá-la por bom preço. Um mecânico, em São Paulo, rapidamente, consertou o defeito. Com a nova impressora a gráfica passou a imprimir livros, tanto de autores da comunidade camiliana, como para terceiros. Aproveitando esta disponibilidade o Pe. Cherubin abriu, ao lado da Igreja, a “Livraria e Papelaria São Camilo”. Por ser a primeira e única do bairro, foi um sucesso total. Ele sabia, que, em princípio, nenhum comércio era permitido no bairro. Arranjou um pretexto e convidou o Prefeito Adhemar de Barros para um almoço, e, na hora da sobremesa, pediu para o prefeito interceder pela livraria. Adhemar de Barros achou graça no pedido do jovem padre e respondeu: “Você sabe que na Avenida Pompéia é proibido qualquer tipo de comércio. Em todo caso, vou autorizar. Se aparecer algum fiscal demorará anos para conseguir decifrar a minha letra”. E a livraria e papelaria continuou funcionando por muitos anos, sem nunca aparecer fiscal nenhum.

Quanto à gráfica, agora muito mais bem equipada, também começou a atender grandes clientes externos. Um destes clientes que o padre arranjou era a revista “Sete Dias na TV”. A publicação era semanal e tinha uma tiragem de 350 mil exemplares. Pelo contrato, o conteúdo precisava ser entregue na quarta feira e a revista precisava estar pronta na sexta-feira de madrugada. Com esse e outros bons contratos os lucros cresceram. Então, com os recursos obtidos na gráfica, o Pe. Cherubin pagou a conclusão do Seminário que a ordem mantinha em São Paulo e ainda fez uma grande reforma no seminário de Iomerê, aquele onde ele havia iniciado seus estudos, em Santa Catarina.

O ECÔNOMO DA PROVÍNCIA

Em outubro de 1957, apesar de ter apenas 25 anos e pouco mais de um ano como padre, a excepcional habilidade demonstrada pelo Pe. Cherubin em lidar com os negócios e as finanças da gráfica levou o Provincial da Ordem a nomeá-lo como Ecônomo Provincial. Na terminologia eclesiástica, o Ecônomo equivale ao diretor administrativo-financeiro da instituição. A ele cabe coordenar toda a movimentação financeira da Província e das casas religiosas.

É verdade que a Província Camiliana da época era diminuta e não tinha muitos quadros, ainda assim, era uma enorme responsabilidade para o jovem padre.

Segundo Sêneca, “sorte é estar preparado para quando surge a oportunidade”. O Pe. Cherubin, dotado do senso prático adquirido no seio da família de colonos e com a maturidade de ser órfão de pai desde os dois anos de idade, aceitou a incumbência com o entusiasmo com que já vinha cuidando de suas outras responsabilidades. Logo que assumiu viu que o dinheiro era curto para atender todas as necessidades. Tratou, assim, de reduzir custos e obter mais receitas. Para otimizar os recursos disponíveis comprou um caminhão Chevrolet usado. Foi uma decisão abençoada. O motor de seis cilindros bebia gasolina como camelo bebe água, mas, naquele tempo, o preço da gasolina era mais barato que água engarrafada. O Caminhão, desde o primeiro dia, começou a ser usado para ir buscar alimentos e produtos agrícolas mais baratos no sul do país. Abastecer as despensas das casas religiosas paulistas custava um bom dinheiro. Indo buscar no Sul, a economia era substancial. Além disso, aproveitando o caminhão, o Pe. Cherubin passou também a trazer vinho do Sul para São Paulo. Vinha vinho de missa, claro, mas também chegavam garrafões e mais garrafões do excelente vinho colonial produzido na terra dos vinhedos. Vinho esse que era vendido ao público pela cantina da paróquia da Vila Pompéia. O povo até brincava dizendo que o vinho tinha que ser bom porque, afinal, os padres garantiam que não era batizado!

Usando criatividade, espírito de iniciativa e bom senso, o Pe. Cerubin conseguia atender todas as necessidades da província e ainda fazia sobrar dinheiro para enviar para a casa central, em Roma. Era dessas remessas que saía o custeio da Congregação, a manutenção dos seminários, as passagens para as viagens dos padres. O desempenho do Pe. Cherubin foi de tal ordem que acabou ficando na função de ecônomo da Província Camiliana por 45 anos, de 1957 até 2002.

O RESGATE DO HOSPITAL SÃO CAMILO

Segundo relata em suas memórias, foi num fim de semana em 1961 que o Provincial Camiliano, Pe. Calisto Vendrame, seu superior, o chamou para informá-lo que o Conselho Provincial da Ordem havia decidido nomeá-lo Diretor Administrativo do Hospital São Camillo.

O Pe. Cherubin foi tomado de surpresa e argumentou que não tinha preparação específica para a função. Acrescentou que, até aquele dia, só tinha entrado em um hospital para ser submetido a uma cirurgia de extração das amidalas. O Provincial retrucou: “quando você assumiu a administração das Artes Gráficas São Camilo também não tinha preparação específica e deu certo”.

O Hospital São Camilo, com 70 leitos, era a instituição mais importante que a Congregação tinha no Brasil. Afinal, os camilianos existiam exatamente para cuidar dos enfermos. Sua inauguração havia se dado apenas um ano antes, em 1960, e coroava os esforços de 37 anos da instituição no país. Esforços que iniciaram em 1923 quando o Pe. Inocente Radrizzani chegou ao Brasil, assumiu a Paróquia da Pompéia e criou a Policlínica São Camilo. Conquanto só oferecesse atendimento ambulatorial, consultas e pequenos procedimentos sem internação, a policlínica foi, por muitos anos, o único estabelecimento de saúde do bairro.

A construção do hospital, propriamente dito, começou em 1946, quando o Pe. Radrizzani criou uma comissão para esse fim. A campanha de arrecadação recebeu o nome de “SOS” (Socorro às Obras Sociais) e foi presidida, desde o início, por Laudo Natel, o banqueiro diretor do Bradesco que veio a ser governador do Estado de São Paulo por duas vezes. Laudo Natel também foi presidente do São Paulo Futebol Clube e foi quem construiu o Estádio do Morumbi. O interessante é que ele terá feito seu bem-sucedido aprendizado em arrecadação de fundos quando presidiu a comissão de construção do Hospital São Camilo. Diferentemente do Ypiranga, de Erechim, que construiu seu estádio com sorteios e uma abordagem que empolgou a cidade e a região, o Hospital São Camilo foi construído penosamente, tijolo a tijolo, com doações, bingos e quermesses. Mas, de uma forma ou de outra, estava de pé e pronto para funcionar.

Só que uma coisa é construir e outra é administrar.

No dia em que o Pe. Cherubin assumiu a direção do São Camilo tomou um susto. Descobriu que o hospital tinha tão somente três clientes internados. E o caixa estava perigosamente perto o zero. Disputas internas, conflitos de interesse, egos inflados e inabilidade do Diretor Clínico estavam afundando o hospital.

Por sugestão do Pe. Novarino Brusco, capelão camiliano do Hospital Matarazzo, na época um hospital com 500 leitos na região da Avenida Paulista e um dos maiores e mais prestigiados da cidade, foi convidado o Professor Dr. Mário Degni, que ali dirigia o Departamento Vascular, para assumir como Diretor Clínico. O médico e professor de renome internacional, com grande equipe e vasta clientela, após acertar os ponteiros com o Pe. Cherubin, assim como ele perfeccionista e obcecado por resultados, aceitou a função e mudou-se com armas e bagagens para o Hospital São Camilo. Trabalhando lado a lado, ele e o Pe. Cherubin, formaram uma parceria de esplendidos resultados por 30 anos, que só terminou quando, ambos no mesmo dia, deixaram em definitivo suas funções. Por esta época o São Camilo Pompéia já tinha sido ampliado para 311 leitos, apresentava excelente ocupação e pensava em novas expansões. O afastamento de ambos coincidiu no mesmo dia, mas por razões diferentes. O Dr. Mário Degni, que estava com oitenta anos, preferia aposentar-se. Era o que pensava fazer já há algum tempo e ia protelando porque amava a medicina, mas aproveitou a ocasião por desejar evitar o stress inescapável de um novo relacionamento com o futuro diretor. O Pe. Cherubin, por sua vez, havia sido chamado a assumir encargos incompatíveis com sua permanência na função.

CONTROLE DO CÂNCER

Em 1967 o Pe. Cherubin inaugurou no Hospital São Camilo da Pompéia o Instituto São Camilo de Prevenção e Tratamento do Câncer Ginecológico. Prestigiando a inauguração do novo serviço, em evento com banda de música, pompa e circunstância, estiveram o governador Laudo Natel, amigo do tempo da construção do Hospital, o prefeito, Brigadeiro Faria Lima, no auge de seu prestígio, além de vereadores, deputados e outras autoridades.

Em 1968 o Instituto realizou o 1º Simpósio de Prevenção e Tratamento de Câncer Ginecológico. O sucesso foi tal que o governo do Estado introduziu em todos os seus postos de saúde os exames de prevenção do Câncer ginecológico conhecidos como exames de Papanicolau. Ainda com apoio do Governo do Estado o Instituto montou o primeiro laboratório de Citologia e Anatomia Patológica do Estado.

O Instituto também foi pioneiro no combate ao câncer de mama e trouxe o primeiro mamógrafo para o Brasil em 1971.

Em 1973 o prof. João Sampaio Góes Jr, diretor do Instituto, assumiu o posto de diretor da Divisão Nacional de Câncer do Ministério da Saúde. Com base em sua formação médica e pela experiência no São Camilo, o Prof. Góes criou o Programa Nacional de Controle do Câncer. A iniciativa previa a importação de grande quantidade de equipamentos a serem distribuídos para todas as entidades de câncer no país, bom como a ampliação e abertura de novos hospitais especializados. Para conseguir a aprovação dos expressivos recursos para o programa, o Dr. Góes levou o Pe. Cherubin na audiência com o Ministro da Fazenda Delfin Netto. Ele achava que, embora fosse ele o Diretor da Divisão de Câncer do Ministério da Saúde, ele era o médico e ele conhecesse os detalhes do programa, era o Pe. Cherubin que sabia como obter dinheiro com o pessoal do governo. Na audiência o Pe. Cherubin começou por perguntar se o Ministro tinha na família, ou entre seus amigos, alguém com câncer. Não, o Ministro não tinha. Mas sabia quem tinha. Era o Presidente da República, Emílio Garrastazu Médici, que tinha uma irmã tratando a doença. Não deu outra. Os recursos foram liberados tão rápido que mal voltaram para São Paulo, alguns dias depois, e o dinheiro já estava disponível. Mas os efeitos da iniciativa não pararam por aí. Depois de conhecer os detalhes do projeto e saber mais sobre o Pe. Cherubin, que na época, no meio de uma dezena de outros cargos e funções, era também presidente da Associação dos Hospitais do Estado de São Paulo, o Presidente Médici decidiu que o melhor mesmo era colocar o Pe. Cherubin para fazer o projeto do câncer andar. E, pensando melhor, aliás, ele parecia ser o homem certo fazer toda a Assistência Médica e Hospitalar do País para andar. Então chamou o Pe. Cherubin e o nomeou como Coordenador da Assistência Médica e Hospitalar do Ministério da Saúde. (Mais adiante apresento um resumo da chacoalhada que o Pe. Cherubin deu no ministério…)

Em São Paulo o Instituto continuou a evoluir no atendimento ao público e, em 1977, o prof. João Sampaio Góes Jr., já de volta ao comando do Instituto, propôs mudar seu nome para IBCC – Instituto Brasileiro de Controle do Câncer. Ele achava que colocar no nome a ideia de controle representaria melhor o propósito do instituto, cuja ênfase deveria ser, cada vez mais, antecipar, prevenir e fazer diagnósticos precoces. Afinal, como entendia o Pe. Cherubin com sua visão prática: “dizem que saúde não tem preço, mas tem custo. Por isso é melhor fazer prevenção. Ela, além de salvar vidas, tem custo mais barato!”

Em 1979 a Prefeitura de São Paulo concedeu em comodato uma área de 18.500 m2 na Zona Leste da Capital e o IBCC transferiu-se para o novo endereço. Também houve uma mudança estatutária para facilitar a gestão e os investimentos. O Pe. Cherubin assumiu o cargo de presidente, cargo que manteve até meados da década de 2010.

Mais recentemente, para facilitar a fixação da marca, o Instituto passou a adotar o nome estendido de IBCC – Oncologia. Acontece que, mesmo sendo uma das mais conhecidas instituições dedicadas ao controle do câncer no país, sua campanha de conscientização sobre o câncer de mama é mais conhecido que ela. Todo ano são realizados campanhas e eventos que utilizam o símbolo do “Alvo Azul”, representado por três círculos azuis com o tema “O Câncer de Mama no Alvo da Moda”.

A campanha, que é realizada mundialmente, foi criada em 1994 pelo designer de moda Ralph Lauren, nos EUA, e trazida ao Brasil em 1995 pelo IBCC do Pe. Cherubin.

A Hering, de Santa Catarina, a empresa licenciada para produzir as conhecidas camisetas e abrigos com o Alvo Azul, fornece seus produtos para o mercado e realiza uma campanha no Dia das Mães. Em 30 anos de campanha a Hering já vendeu mais de 8 milhões de camisetas e contou com a participação de mais de 400 artistas e celebridades e mais de 100 empresas parceiras, tendo arrecadado mais de R$85 milhões.

Outro evento importante é a Corrida e a Caminhada da Campanha “O Câncer de Mama no Alvo da Moda”. Neste ano de 2025 será realizada a 62ª edição, estando marcada para ocorrer em São Paulo, no domingo, dia 12 de outubro, coincidindo com o feriado de N. Sra. Aparecida e com o dia da Criança.

(Continua na próxima edição)